terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

T.

Cada olhar dele me estranhava, mesmo eu sendo velha conhecida. Olhos que buscavam enxergar além de mim, e que me sorriam se eu lhes confundisse. 

Me beijou. Riu do gosto de chiclete de canela com cerveja. Ri só por ele estar rindo para mim. Sorte grande. 

Me abraçou. Implicou com meus quilinhos a mais. Revidei. Implicância de amor... 

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Escritoriando

O barulho do grampeador ritimado e certeiro marcava os segundos que não passavam. 
O relógio, que meus olhos cansados questionavam: estaria sequer funcionando? 
A chuva lá fora não era convidativa. O telefone estridente, a cadeira giratória. As pilhas de papel me encaravam por todo lado. 
Quinta-feira de tempo frio e tempo lento. 

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Mais do que eu

Esses dias, conheci alguém mais inseguro do que eu. Mais sensível, mais medroso, mais maduro. E também mais ansioso. Alguém mais eu do que eu. 
É alguém que eu conheço aos poucos, que me encanta mais que os outros - e diz se encantar comigo. Me encanta mais do que eu. 
E vez em nunca, os dias trazem defeitos meus - defeitos nele, que são meus. Defeitos nossos.
É alguém que eu venho conhecendo e descobrindo, como quem descobre a si mesmo no outro. E me confunde mais do que eu, me assusta mais do que eu, por me apaixonar mais do que ele. 

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Grades do interior

A casa fechada - o silêncio que ronda.
O relógio no pulso, na parede e na tv - mostram as horas que não chegam. Trazem de volta a minha ansiedade: velha companheira, que faz dos meus pensamentos, inimigos.
E a luz da lua, que bate na varanda. E a foto rasgada na gaveta. E os chinelos abandonados em um canto - os pés livres no chão.

O corpo todo livre - tem as luzes da cidade inteira para explorar.
A mente engaiolada - assombrada por pensar demais.



sábado, 20 de julho de 2013

Tropeços

Uma noite em claro.
E a certeza de que, no meu escuro particular, existe uma bagunça maior do que eu consigo enxergar. 

Não ouso levantar da cama - já cansei de tropeçar tantas vezes em memórias jogadas pelo chão. Uma ali, outra aqui, sempre me pegam de surpresa. E, apesar de antigas, ainda me fazem cair. 

Melhor esperar que o dia clareie, para tentar, mais uma vez, catar cada pedaço meu do chão. O que me inquieta é o tempo que ainda levará para o sol raiar.

domingo, 14 de julho de 2013

Mais um desabafo pela metade

Pela primeira vez, eu te vi com outra pessoa. E tudo voltou como uma avalanche.
Há um ano e pouco, te deixei ir. Há alguns meses, quase voltei atrás. Pensei, hesitei... fiquei no quase. E há alguns dias, eu vi - assim, frente à frente- que um antigo amor tem, agora, um novo amor.
Confesso que essa foi difícil de engolir, desceu ardendo.

Disse à mim mesma que eu estava sendo egoísta - mas eu nunca me escuto.
Tentei fugir - mas não tinha para onde ir.
Onde eu olhava, você estava. E do seu lado, alguém que tinha um pouco de mim - mas que eu, em parte, rejeitava.

E assim foi aquela noite de sexta, que ainda não me saiu da memória. Cada gole de uma cerveja sem gosto era uma tentativa de aliviar aquele ardor na boca do estômago - mas não ajudava. Acordei com a cabeça pesada, e me perguntando, mais uma vez, sobre as minhas escolhas. Sobre quem eu fui para você e sobre quem eu gostaria de ter sido. Então, meu corpo inteiro pesou.

domingo, 7 de julho de 2013

Do Escuro

A cada suspiro, sinto o sufoco engrandecer dentro de mim. O escuro no fechar dos olhos me inquieta e me acalma, por mais estranho que pareça. O alívio de não ver nada e a ansiedade de te encontrar estão em um conflito permanente dentro de mim. E a negritude que me envolve, me cerca... É como se eu tivesse mergulhado no negro dos seus olhos.

O tórax que se expande e se contrai absorve e expulsa as lembranças que tenho de ti.

É inútil expulsá-las- elas voltam sempre que inspiro.
"Não sou nada
Nunca serei nada
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo "

Fernando Pessoa